Vadias e Vândalas

Em 2011, quando a Marcha das Vadias começou, os argumentos contra eram, basicamente, os mesmos de hoje: se você procura por respeito, por que sair sem camiseta e se intitular vadia? Mesmo com os debates das Marchas das Vadias afiadíssimos nas redes sociais, esse discurso do “quer respeito se dê ao respeito” não saiu de moda, infelizmente.
Porém, com o tempo e a popularização da palavra ‘vandalismo’, por conta dos protestos nas ruas de 2013, os argumentos contra as Vadias ganharam um novo tom: somos todas vândalas.
Em 2013, ocorreu uma perfomance na Marcha das Vadias do Rio de Janeiro que fez com que não só a marcha carioca tenha sido transformada em mártir do vandalismo, mas também as Marchas das Vadias do Brasil inteiro. Algumas pessoas gritaram que essa perfomance “sujou” o nome da Marcha das Vadias, como se em algum momento a marcha fosse vista como algo “limpinho”. A discussão aqui não é sobre o certo ou errado da perfomance, mas sobre a força e o repúdio quase instantâneos que aparecem quando o alvo é a Marcha das Vadias.
Na Marcha das Vadias de Curitiba – 2014, o motivo para nos chamarem de vândalas foi a estátua da mulher nua, que carinhosamente chamamos de Maria. Todo ano a organização da marcha pinta e enfeita a Maria, com batons, flores, retalhos. E esse ano usamos tinta guache. Gritaram: VÂNDALAS! Porque enfeitamos a estátua que nos outros dias fica cheia de sujeira.

Marcha das Vadias protesta a favor da liberdade da mulher e contra o machismo em Curitiba/PR. Foto de Vagner Rosario / Futura Press.
Se não tivéssemos pintado a estátua da mulher nua, teriam inventado outra desculpa qualquer para dizer que a Marcha das Vadias Curitiba é imoral, vândala, etc. Estátua essa esquecida, ninguém liga para ela, assim como esquecem da violência contra a mulher. Violência que é praticada todos os dias nas cidades, no país, em nossas vidas. E, no dia da Marcha sempre enfeitamos Maria em um ato simbólico, que grita no ouvido de todas as mulheres: SE EMPODERA! VEM PRA RUA! A rua é nossa. A cidade é nossa. O corpo é seu, só seu e ninguém pode tocá-lo sem sua permissão. Marchamos e gritamos juntas que “o corpo é da mulher e ela dá pra quem quiser”
É uma estátua, a tinta é lavável, mas quem se importa? O importante mesmo é achar uma desculpa para nos chamar de vândalas, dizer a mesma ladainha de sempre: “se querem respeito porque saem sem camiseta?”.
A questão é que não marchamos por respeito. Respeito é pouco, respeito é migalha. Marchamos porque queremos existir do jeito que a gente quer e não do jeito que dá.
Não queremos ser mulheres com uma taxa de feminícidio tão alta, com medo de sermos estupradas, tendo que ser mulher de um jeito X porque se saímos desse modelo a sociedade inteira vai te chamar de desleixada, feia. “Como você vai achar um marido assim?”, “Quando que vai ter um filho?”, “Credo, você pariu fora do hospital, que mãe você pensa que é?”, “Nossa, você não vai ter filho? Se você não for mãe não vai descobrir o que é ser mulher!”, “Seja magra!”, “Engorde mais, tá muito magra!”, “Depile-se!”, “Alise esses cabelos!”, “Exista do jeito que eu quero!”, “A culpa é sua!”.
E o que eu vou falar para essas pessoas? Pedir por respeito? Respeito é pouco. Eu vou é vandalizar minha vida, essa categoria normativa do que é ser mulher. Eu vou existir do jeito que eu quero. E eu não quero seu respeito, quero que você saia da frente que eu tô passando com o meu corpo empoderado, mesmo que você faça de tudo para apagá-lo. Meu corpo existe. Sou mulher, sou empoderada, vandalizo meu próprio corpo. Sou vadia!
Postado em:  por:  (Blogueiras Feministas) 

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